Ai que bom você chegou
Com o diabo no quadril, trazemos novidades de Salvador - uma daquelas viagens que nos faz respirar fundo antes do mergulho.
Após uma breve pausa (atraso, na verdade), estamos de volta. A pausa foi necessária. Estávamos em Salvador, coração do Brasil (DO BRASIIIIIL). Fomos ao Festival de Verão e nos emocionamos, mergulhamos com Yemanjá e nos emocionamos, abraçamos muito e nos emocionamos, suados.
A newsletter tá saindo hoje e vem uma atualização na próxima sexta-feira, como sempre.
Bons mergulhos, nós voltamos assim como Thais:

A minha casa além do Carmo - por Piera
Eu tenho paixão pela minha casa. Quem me conhece, sabe o quanto adoro minha casa. Depois da pandemia e no período do #ficaemcasa passei a me dedicar para que ela fosse o melhor lugar do meu mundo, e assim ela é até hoje. Desde que eu e Julio juntamos nossas artes (nosso jeito de dizer que fomos morar juntos), fazemos da nossa casa o nosso objeto de maior parceria de criação, pensamos em cada canto, quadro, vaso, para que ali seja o lugar onde a gente se encontra e deseja ficar.
Divido essa paixão pela minha casa com a paixão por viajar. Toda essa distância entre as duas paixões faz com que eu procure por casas quando longe, não no sentido de procurar no airbnb ( que aliás amo e já fiquei em lugares maravilhosos), mas no sentido de procurar lugares onde pessoas se dedicaram muito para que tudo ali fizesse ser casa. Os lugares que são assim, você sente quando entra pela porta, tem um cheiro, uma luz, um objeto que entrega: ali é casa. Geralmente esse sentimento é confirmado com alguém que te recebe com um calor, um sorriso e às vezes até um certo mau humor, daqueles que só quem tem intimidade consegue direcionar.
Assim foi com a minha casa em Salvador, cheguei lá para tomar um café da manhã com algumas amigas, uma delas tinha recebido a dica de um casal no avião com a promessa do melhor café da manhã de Salvador. Chegamos nos últimos momentos do café, e por algum motivo Dona Fernanda teve empatia por aquele grupo de mulheres, todas vestidas de vermelho, com batons e olhos borrados com o suor que só Dezembro em Salvador proporciona, saídas da manhã de festa de Iansã, famintas.
A pousada-casa fica em Santo Antônio Além do Carmo, o bairro que eu gosto de chamar de meu na cidade, cheio de casas coloridas, algumas com vista para a Baía de Todos os Santos, como é o caso da Boqueirão.
Voltei pouco tempo depois e fiquei hospedada ali pela primeira vez, já andando descalça pela casa, subindo na estufa de plantas e temperos para assistir o pôr do sol, puxando conversas com Dona Fernanda e com Luccia, sua filha que fica encarregada da parte doce da acolhida.
Já fiquei em diversos quartos da pousada, os menores são aconchegantes, existe um que cabe com muito conforto 6 pessoas (conta com 2 banheiros, o que é essencial) e os maiores e mais charmosos tem terraço e espreguiçadeira, ideal para o home office, para tomar sol entre uma reunião e outra.




Sobre o café da manhã, prometido pelo casal do avião, ele realmente é dos melhores, não só pela comida deliciosa e o atendimento impecável, mas pela vista e a brisa que faz com que você desacelere antes de começar o dia.
A localização também é ótima, fica na principal rua do Carmo, onde ficam deliciosos restaurantes, bares e o Largo, tudo perto o suficiente para ir e voltar a pé e distante o suficiente para não atrapalhar o sono.
Sobre o que me fez sentir em casa ao entrar, lá tem o cheiro (dessa última vez era um cheiro de bolo de banana com as bananas colhidas no quintal), a luz e todos os objetos, muitos ali poderiam estar em museus e galerias, mas estão ali, em casa.
Espero que, se você for pra Salvador, passe por ali, seja para tomar café (liga antes pra reservar) ou pra morar uns dias, e te desperte o sentimento tão potente de casa.
Zanzibar, o restaurante dos sonhos - por Julião
Não me lembro muito dos meus sonhos. Sou daquele tipo que acorda e não consegue se recordar de quase nada, sabe? Mas tem um sonho que guardo com muito carinho e não me esqueço de nenhuma cena.
Era uma mulher em seu leito de morte, no hospital. Sofria muito, ela precisava morrer, mas não queria, ou não conseguia. Eu estava ao seu lado e falei para ela fechar os olhos e que faríamos uma contagem regressiva. Eu comecei: 10… se lembra do seu lugar preferido no mundo; 9… agora pensa num cheiro de infância, aquilo que faz você lembrar da casa da sua avó. E eu seguia na contagem e trazendo lembranças, até que, ao acabar a contagem, ela morreu em paz.
Uma das lembranças que pedi pra ela ter no sonho era da comida preferida dela, aquela que a fazia salivar só de pensar, e que ela comeria em qualquer momento do dia.
Se fosse comigo, se estivesse em meu leito de morte, lembrando da minha comida preferida, pensaria na comida do Zanzibar, restaurante do ladinho da nossa pousada lá em Salvador, em Santo Antônio Além do Carmo.
Meu prato dos sonhos é a carne de fumeiro com purê de banana da terra. Nós, sudestinos, não temos muito contato com o tal fumeiro. A Piera, claro, que me apresentou. É carne de porco salgada e defumada em madeira de mangue, normalmente, coxão mole, natural ali da região do Recôncavo Baiano. Essa defumação deixa a carne com um fundinho doce, que se mistura com o sal e a gordura. Dá um pau no bacon.
Esse processo de preparo, tão artesanal, não conta com o aval da Anvisa, e por isso, não temos o fumeiro espalhado pelo país.
Voltando ao prato, o Zanzibar nos proporciona uma montanha-russa de sensações com esse prato: o fumeiro, cortado em tirinhas, é frito na manteiga, eu imagino, e fica bem tostadinho, com uma casquinha deliciosa e macio na mordida. A primeira sensação ao encostar na língua é o salgado. Lembra um pouco a carne seca ou carne do sol. Aí vem o defumado, que preenche o céu da sua boca e te prepara para a próxima sensação, o doce, que te faz um carinho antes de te espancar: o melhor purê da face da terra. Doce na medida, ácido na medida e aveludado. Segue a foto:
De entrada, tem um pastel de siri muito gostoso, mas recomendo fortemente o melhor acarajé da vida. São nove pequenos bolinhos, os mais leves que já comi. Parece uma nuvem de dendê. O recheio vem separado, para você montar ao seu gosto. No meu, uma colherada de tudo e duas gotinhas de pimenta, por favor.
Olha a foto:
O Zanzibar é um restaurante de cozinha africana com afeto baiano e o cardápio é assinado pela chef Ana Célia. Tem vista para a Baía de Todos os Santos e atendimento carinhoso. Fomos três vezes em nove dias, encontramos Malu Mader (belíssima, aliás) e fiquei sabendo que por pouco, não encontramos Ney Matogrosso (que pena).
Já voltamos e continuo aqui, sonhando e esperando o reencontro com o fumeiro.
E se você tiver um fornecedor de fumeiro aqui em São Paulo, dá um toque.
Ditadura das festas
Na próxima edição vamos falar sobre como celebramos a vida em Salvador, mas já queremos adiantar aqui uma dica caso você chegue em Salvador em algum momento deste verão: não se esqueça de sapatos confortáveis e alongamento da lombar em dia. Salvador vive em constante estado de celebração: da vida, do calor, dos corpos suados e da fé. Tudo isso com a alegria no coração do fim de uma pandemia e de um pandemônio.
A cidade está em festa e você, com certeza, vai se ver dentro dela, seja na rua, nos Largos, nas praias ou museus, é a ditadura das festas e não existe auto controle possível, é Timbalada numa esquina, Baiana System na outra e no meio uma Margareth Menezes, e quando você vê tá gritando MINISTRA e pulando sem parar.
É isso, já deixamos aqui dois lugares para buscarem a agenda da cidade e perder qualquer controle: aqui e aqui.
Em breve vou pra Salvador e já salvei tudinho aqui <3
Meu jeitinho de reviver os lugares que amo é encontrar meus sabores favoritos do nordeste aqui em SP, infelizmente ainda não encontrei uma boa carne de fumeiro, mas o bolinho de fumeiro do Sotero é o melhor ate hoje.